domingo, 16 de março de 2014

Crónica Rosário Breve - Onde falam homens/ calam-se estátuas por Daniel Abrunheiro

Eu agora era o Salgueiro Maia/ capitão não de mas por Portugal/ eu agora como sempre até agradeceria que nem me mudassem de sítio/ isto porque o sítio onde eu estiver há-de ser sempre apenas o sítio onde eu me quiser/ eu morto ou vivo/ ou eu mais vivo agora até do que nunca/ hoje  até se calhar/ mais do que alguma vez/ preciso sou do que no sítio onde estou/ escusado é até que chamem Liberdade ao Jardim onde me puserem/ liberdade há-de ser sempre o sítio onde homens como eu estiverem/ nunca na puta-da-vida liguei a efemérides de busto-em-vida/ da minha vida a despedida terá sido fugaz mas nunca arrependida/ a chatice do cancro/ chove Deus ou o Diabo por ele a cancros/ a melancolia de deixar pesarosa a mulher que tive por privada rosa/ mudar-me de sítio para quê? / mudem mas é de sítio a des-gente do meu País/ esta sub-canalha que nunca há-de ser feliz/ não de azimute-topografia/ não a mera rectangular geografia/ mudem-se-vos antes dessa estranha gente canalha que mais despreza a terra contra quem mais a trabalha/ e que faz de todos nós connosco mesmos mudos da surdez da voz/ um País de si mesmo Pátria indiferente/ uma estátua de sal para mim não é ser natural/ é nocivo/ é virtual/ alguém que pela tarde fria/ da História-Pátria-Mitologia/ viu na estátua de sal/ um tal Salgueiro Maia tudo menos real/ alguém que olhou para trás e se arrependeu/ ora tal tipo de gajo ou capitão nunca fui eu/ tive pena até do Marcello do catano com dois éles/ coitado/ ratito  encafuado no Carmo/ onde o cerca-sitiei/ por e de maneira que eu cá sei/ na manhã atónita vibrava o megafonialtifalante/ como quem vibrava o nítido futuro naquele mesmo instante/ do cravo o rendilhado rubroverdeava tanta coisa rouca/ que até ser livre/ começando-o só a ser/ parecia coisa tão pouca/ e a minha mulher tão preocupada em casa/ as mães-mulheres deste País/ desinfeliz/ tão preocupadas em casa/ rosa/ asa/ digo/ mulher em casa/ sem saber se ir a pé a Fátima/ se de chaimite ao futuro/ um homem é um homem/ uma rosa é um País/ é um homem com mulher/ lembro-me agora/ estátua/ de ter mudado de sítio por ter sido eu a querer fazê-lo/ bronze ou não/ sal ou sopas/ quero lá saber/ eu agora não era isso/ eu estátua é que nunca fui/ estátua é que eu nunca fui não/ saí de Santarém e vi Lisboa/ a madrugada era boa/ amanhã ainda sou Salgueiro & Maia & Capitão.

O País é que se calhar não.

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