sábado, 27 de fevereiro de 2016

O Arquitecto e Cartoonista António Ferreira dos Santos (F´Santos) faleceu a 24 de Fevereiro de 2016

O Arquitecto e Cartoonista António Ferreira dos Santos (F´Santos) faleceu a 24 de Fevereiro de 2016 após prolongada doença cancerígena. Natural de Cucujães – Oliveira de Azemeis (30/8/1948) licenciou-se em Arquitectura na Escola Superior de Belas Artes do Porto e exerceu actividade como arquitecto (urbanístico) na Câmara Municipal do Porto. Desde sempre se dedicou ao desenho de humor e seus primeiros trabalhos publicados na imprensa surgem em 1971 em “A Voz Portucalense”. Em 1988 começou uma colaboração regular no semanário “O Regional” de S. João da Madeira que se prolongou por décadas. Tem também trabalhos publicados na revista “A Razão” e nos jornais “O Jogo”, “O Público”, “Diário de Notícias”, “Jornal de Notícias”, “Comércio do Porto”, “O Inimigo”, “Terras da Beiras”, “Trevim – Supl. Bronkit”…
Realizou exposições individuais, no âmbito do desenho e da pintura no Porto, Ovar, S.J. Madeira, Rio Tinto, Matosinhos, Coimbra e Lisboa.
Participou em diversos Salões Internacionais de Humor no estrangeiro (Croácia, Rússia, Eslováquia, Espanha, França, Itália, Reino Unido, Turquia e Japão… onde foi galardoado em 1998 com um 3º Prémio no “V Certame Internacional de Tenerife – Canárias Espanha”), assim como em Portugal (Vila Real, Porto de Mós, Oeiras, Porto, Idanha-a-Nova, Coimbra, Penela e Espinho…) tendo sido premiados em 1989 no Salão nacional de Caricatura – Porto de Mós com o Troféu Humor e o Ambiente; em 1996 com o Prémio Nacional BD de Imprensa, no X Salão Nacional de Caricatura – Salão nacional de Imprensa – Oeiras e em 2000 com uma Menção Honrosa no I Salão de Humor de Aveiro. No âmbito da V Mostra de Humor Gráfico de Alcalá de Henares foi distinguido com o título de Professor Honorífico del Humor da Universidade de Alcalá de Henares – Madrid em 1998.
Participou em centenas de Festas da Caricatura organizadas pela Humorgrafe e não só, por todo o país e em Espanha (Ourense, Madrid…) assim como realizava caricaturas para Livros de Curso e em eventos de empresas de caricaturas ao vivo.
Ferro Rodrigues
Bibliografia: para além dos catálogos de Salões, ou exposições temáticas organizadas pela Humorgrafe (Rock in Caricatura, Vozes Líricas do séc. XX, Esse ser… Comediante, Humor e Saúde, “Caricaturistas por Timor, “Paródia & Pastiche, A Censura na Iconografia e na Caricatura Portuguesa, Humor d’Arquitecte, Comunicar com Humor, 150 Anos da Caricatura em Portugal, A Luta dos Trabalhadores (pelo humor), Tolerâncias e Intolerâncias da Humanidade, Humores ao Fado e á Guitarra, Humor Negro, O Bobo… ) publicou três coleções de postais – “Urbanovisões”, “Mupivisões” e Mijopostaise; em 2000 publica o livro de cartoons “O Dedo na f’rida”, em 2002 “Errare Urbanum Est”, em 2007 Cartoonices” e em 2013 “Kito”
Nos últimos anos, afastado da imprensa, com o pseudónimo de António Sabão cultivou vários blogs como cartoonisces, Saboonices http://cartoonicesasequela.blogspot.pt/, http://antoniosabaokito.blogspot.pt/ , http://toonnices.blogspot.pt/ http://caricartono.blogspot.pt/ , http://antoniosabaopintor.blogspot.pt/

Para o seu livro “Dedo na F’rida”escrevi este prefácio – Reconsiderações à volta de um cartoonista.
Ao longo dos anos tenho aprendido que nem todfos olham a vida da mesma maneira. Existem os cegos, os míopes, os astigmáticos… e os humoristas. Contrariamente a todos os outros que por defeito físico são optimistas e procuram adaptar-se da melhor forma à vida, a melhor forma de corrigirem o que vêem, os humoristas / caricaturistas são essencialmente “pessimistas” reconstrutivos.
No caso de F’Santos pode faze-lo por duas vias distintas, seja pela circunvalação, seja pela cintura interna, acabando no Cerco à sociedade, que neste caso concreto é o Cerco do Porto. Quero eu dizer que o caricaturista é pessimista porque olha sempre com comiseração para os outros. Olha com compaixão para todos aqueles que necessitam de pessimistas como interlocutores, para verem a realidade de uma forma irónica, satírica ou humorística. Para desvendarem a realidade nua e crua. /…/ António Augusto Ferreira dos Santos é um desses pessimistas que nasceu com o olhar “deformado” e que, desde novo, assumiu a missão de missionário da verdade irónica. Com a idade, ele tentou comprar esses óculos que se vendem nas farmácias, ditos milagreiros, mas nem assim deixou de ver o mundo deformado no grotesco do dia a dia.
/…/ Ferreira dos santos é um cultor de amizades, é um artista do belo pelo exagero. Um activista da estética sempre pronto a colaborar, a apoiar com a sua arte todas as causas nobres, a lutar pelo dignidade de um género estético, por vezes tão denegrido e incompreendido. /…/ A sorrir e por vezes a chorar com raiva, denuncia os atropelos dos humanos, desmascara as incongruências dos que para subirem no grau da animalidade social, para ganharem mais uns tostões não se importam de pisar os vizinhos. Contudo, no seu traço há sempre um matizado na agressividade, onde as aguadas, as cores subtis, dão um condão de leveza, de ironia. Ou seja, o seu humor é temperado pela cor.
Acima de tudo não nos podemos esquecer da sua formação de arquitecto, já que esse elemento é uma presença constante, seja como fundo cénico da ideia humorística, seja nas suas preocupações ambientais e estético-arquitectónicas, procurando denunciar, como poucos em Portugal, algumas atrocidades que ele vai encalhando pela via da vida. Ele é, pois, um grande observador, um pessimista que sabe viver com humor e sabedoria.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Rosário Breve - Roma 0 – Cristo 1 por Daniel Abrunheiro

Não se vê uma nuvem. Manhã perfeita. Sem uma gelha. Sem um ponto-persa. Revérberos coriscam no dorso do rio. É muito bom ter, da noite, renascido meridional, atenta a graça da jornada novel. Ao arrepio de antanhos recentes, a luz é de uma pureza riscável à unha. Bêbedas de viço, as aves matinais tripulam os veios azuis, as ramas verdes, o espaço branco, o ouro impagável da totalidade natural. Respirar é uma conspiração de açúcar. Não há por aqui sevandijas, sicários, bandoleiros &/ou corsários. Há gente (não muita) que se desestarrece ao sol franco, pintalgada de joalharias coloridas. Uma dama, que vinha a seu chá-meia-torrada, comete a ontem impensável extravagância da imperial-com-tremoços-mas-é. Um cavalheiro, tido por sisudo, mete-se a graçolar com cada bebé-de-colo que lhe passe ao alcance das unhas aparadas. Fiapo de eternidade, o instante vale um coalho de cal na colina-esmeralda. Não são vaidade, hoje, as lentes-fumadas de marca tornando de mochos cegos os rostos humanos. Não são (tão) frívolas, hoje, as poses do tipo perfil-egípcio com que os leitores do Expresso alardeiam aquela cultura-post-moderna-de-saco que nunca entenderam nem vão entender. Mesmo hoje. Mas adiante. O Sábado, coleante jibóia inócua, vive & deixa viver em uma paz inocente de barbáries. A duas mesas desta sobre que se amanha a crónica pró-Ribatejanos, um miudito faz rir o pai por-causa-de-quási-nada – nada, excepto o facto tremendo de um ao outro pertencerem para sempre. O preto e o branco não dão cinzento, hoje não. Das prévias jornadas februárias, os grandes ventos & as iradas chuvadas não campeiam nem enxurram nem descabelam nem geram gemer. É um bocadito como se o senhor Adão & sua/dele dona Eva não tivessem jamais sido compelidos à reforma mutilada. Com outro bocadito (de atenção, agora), é perfeitamente possível a ressuscitação das espécies extintas pelo plástico do Homem, pelos homens-de-plástico – ou pelo Demo que os não carregou a todos. Até o Tejo (mas, hélas!, só à distância apartada) parece um moço lavado em aparato de pé-de-alferes com a Lezíria que o bebe & deixa beber. Uma pessoa semicerra por instantes as persianas ópticas – & a música, à maneira de toda esfera arredondada pela claridade total, põe-se logo a violinar vivaldismos de passarada sem caçador derredor. A Dívida-Pública? Bah! Hoje (mas só hoje, sabemo-lo bem, que já há muito comemos broa rija), consiste tão-só no que, todos & cada um, devemos ao que é de todos: o perfume das maçãs portuguesas, o patriotismo rescendente do bacalhau, os bons-dias dados como pão novo, a saciedade cervejada daquela tremoceira dama, o patusco que aqueles bebés-de-(tira)colo acham o senhor-sisudo-de-outros-dias. Torpor pasmaceiro – a termonuclear prumo, o vertical meio-dia dardeja todo este santo lirismo sem caruncho, sem génio & sem progénie: este dia é filho-único, como Aquele que sabemos. Como na vida, todavia-toda-a-vida, em instantes se faz tarde. Os telemóveis tornaram a guinchar. O patrão da pastelaria ralhada desabrida & altiaudivelmente com a empregadita mai’ nova – que com as duas mais antigas não se atreve ele. O momento é chegado de nos retirarmos à la française. O exemplar do Correio da Manhã foi parar às mãos do miudito causador de patergargalhadas, que a feltros iridescentes o vai exsanguinando.

E ainda: sem uma nuvem sobre que descansar a augusta cabeça nevada, o Senhor, lá tão de cima, é obrigado a vigiar, cá tão bem baixo, Francisco – achando, como eu acho também, que o Argentino não é católico, mas sim cristão só. E sem gelha per(ver)sa, o danado do Homem. 

"Imprensa Humorística e República", com António Ventura e Ana Vasconcelosno Museu Bordalo Pinheiro (Lisboa)neste Quinta-feira

Esta quinta-feira, pelas 19.00, temos mais uma tertúlia aqui no Museu, desta feita dedicada ao tema "Imprensa Humorística e República", com António Ventura e Ana Vasconcelos. Mas não só. Também será lançado o livro "Luís Filipe e a Farsa da Vida", com a assinatura do triunvirato da casa: João Alpuim Botelho, Mariana Caldas de Almeida e Pedro Bebiano Braga. E assim acontece...!

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Reportagerm da tertúlia de ontem, no Museu Rafael Bordalo Pinheiro (Lisboa) com Osvaldo Macedo de Sousa, Rui Pimentel conversando sobre o Modernismo e o Humor Gráfico

Ciclo de Tertulias - Luis Filipe e a Farsa da Vida
 João Alpuim Botelho, Director do Museu Bordalo Pinheiro e moderador da tertúlia
 João Alpuim Botelho, Rui Pimentel e Osvaldo Macedo de Sousa
 João Carlos Oliveira, da Hemeroteca Digital de Lisboa epresentando "A Farça" que esté on-line
  João Alpuim Botelho, Rui Pimentel e Osvaldo Macedo de Sousa

Osvaldo Macedo de Sousa, historiador do Humor e da Caricatura, e o cartoonista Rui Pimentel a conversar sobre o Modernismo e o Humor Gráfico à boleia da obra de Luís Filipe. 

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Ciclo de tertúlias - Luís Filipe e a Farsa da Vida Galeria do Museu Bordalo Pinheiro - 18 de Fevereiro, 5ª feira, 19 horas Modernismo e Humor Gráfico por Osvaldo Macedo de Sousa e Rui Pimentel

Ciclo de tertúlias - Luís Filipe e a Farsa da Vida Galeria do Museu Bordalo Pinheiro - 18 de Fevereiro, 5ª feira, 19 horas  Modernismo e Humor Gráfico por Osvaldo Macedo de Sousa e Rui Pimentel

Museu Bordalo Pinheiro - Campo Grande, 382 - Lisboa
Entrada Gratuita
No âmbito da exposição Luís Filipe e a Farsa da Vida, o Museu Bordalo Pinheiro vai apresentar um conjunto de três conversas ao longo do mês de Fevereiro, que abordarão alguns aspetos da vida e obra deste autor tão pouco conhecido do Primeiro Modernismo Português. Para cada um destes temas convidámos especialistas de várias áreas (História, História da Arte, Design, Humor, Antropologia) permitindo assim um melhor conhecimento deste artista que há mais de 100 anos foi um dos pioneiros do Modernismo em Portugal mas que só agora a sua obra é apresentada em Lisboa.

18 de Fevereiro, 5ª feira, 19 horas  Modernismo e Humor Gráfico
 Osvaldo Macedo de Sousa (Historiador do Humor e da Caricatura | Humorgrafe)
e Rui Pimentel (Cartoonista)
Antecede a apresentação da disponibilização em linha na Hemeroteca Digital de Lisboa do jornal A Farça (1909 – 1910) de que Luís Filipe foi Diretor Artístico, por João Carlos Oliveira (Hemeroteca Digital / CML) http://hemerotecadigital.cmlisboa.pt/Periodicos/AFarsa/AFarsa.htm


25 de Fevereiro, 5ª feira, 19 horas Imprensa Humorística e República
António Ventura (Historiador - Faculdade de Letras/UL)
e Ana Vasconcelos (Historiadora da Arte Fundação Gulbenkian)
Antecede a apresentação do livro Luís Filipe e a Farsa da Vida da autoria de João Alpuim Botelho, Mariana Caldas de Almeida e Pedro Bebiano Braga

Luís Filipe (1887 – 1949) foi um dos pioneiros do Modernismo em Portugal. A exposição patente no Museu Bordalo Pinheiro Luís Filipe e A Farsa da Vida acompanha o seu percurso artístico, desde os primeiros anos em Coimbra, com o despertar da sua consciência política e social, mas também com a representação de tipos sociais retirados da vida mundana. Foi neste período que publicou o jornal A Farça (1909-1910), um dos primeiros a publicar desenhos modernistas em Portugal, e que faz a ligação ao título desta exposição; os anos que se seguiram à implantação da República, com uma forte presença nos jornais com desenhos acentuadamente políticos, anticlericais e denunciadores de situações de injustiça social; e por fim os desenhos da sua vida adulta, em Viana do Castelo, com caricaturas de figuras locais e representações da cor e movimento do folclore, sempre com um olhar humorístico.

A exposição apresenta também autocaricaturas e obras que outros artistas do grupo de Coimbra lhe dedicaram, como Cristiano Cruz e Almada Negreiros. 

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

II Ciclo de Conferências – Temas Olisiponenses - “Lisboa na Caricatura: pode uma cidade ser tema caricatural?” - a cargo do Dr. Osvaldo Macedo de Sousa, no próximo dia 16 de Fevereiro pelas 18h30 no GEO - Gabinete de Estudos Olisiponenses (Palácio Beau Sejour - Estrada de Benfica, 368 | 1500-100 LISBOA)

II Ciclo de Conferências – Temas Olisiponenses  - “Lisboa na Caricatura: pode uma cidade ser tema caricatural?” - a cargo do Dr. Osvaldo Macedo de Sousa, no próximo dia 16 de Fevereiro pelas 18h30 no GEO - Gabinete de Estudos Olisiponenses (Palácio Beau Sejour - Estrada de Benfica, 368  | 1500-100 LISBOA)
A sátira gráfica, por recair essencialmente no retrato da política, normalmente é cenógrafa em interiores, já que a política verdadeira não se faz na rua, mas nos bastidores do poder. Por essa razão a cidade nem sempre aparece como cenário gráfico da crítica jornalística. Por outro lado, ao não se identificar totalmente um cenário, esquecemos que as cidades estão lá, e na caricatura de imprensa portuguesa, Lisboa encontra-se retratada em suas múltiplas vestes, ou seja a arquitectónica, social e pitoresca… 
Esta breve viagem vai tentar desvendar:
1 - O que caracteriza a caricatura? Exagero, humor, crónica do quotidiano…
2 - O que caracteriza a cidade?
         Arquitectura
         População – Anónima
         Tipos / tradições / costumes / Figurões….
3 - Humores?
         Cidade como alvo
         Cidade como cenografia
         Cidade com seus governantes.

Contando com a vossa presença, atenciosamente
Ernesto José Nazaré Alves Jana (Técnico Superior)
Câmara Municipal de Lisboa
Direção Municipal de Cultura
Departamento de Património Cultural
GEO - Gabinete de Estudos Olisiponenses
Estrada de Benfica, 368  | 1500-100 LISBOA

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Livros sobre Humor e caricatura com textos de Osvaldo Macedo de Sousa - CCXVII - O que é Humor Gráfico? (2014 Escolar editora)


Livros sobre Humor e caricatura com textos de Osvaldo Macedo de Sousa - CCXVI - Kito de Ferreira dos Santos


Ciclo de Tertúlias - Luis filipe e a Farsa da Vida no Museu Bordalo Pinheiro de Lisboa

Ciclo de tertúlias - Luís Filipe e a Farsa da Vida
Entrada Gratuita
Galeria do Museu Bordalo Pinheiro
Campo Grande, 382 - Lisboa

No âmbito da exposição Luís Filipe e a Farsa da Vida, o Museu Bordalo Pinheiro vai apresentar um conjunto de três conversas ao longo do mês de Fevereiro, que abordarão alguns aspetos da vida e obra deste autor tão pouco conhecido do Primeiro Modernismo Português. Assim, a relação entre o Folclore e o Modernismo vai ser debatido no dia 13, o Humorismo e o Modernismo serão o objeto da conversa no dia 18, enquanto no dia 25 iremos enquadrar a obra deste artista na imprensa republicana dos anos 1910.
Para cada um destes temas convidámos especialistas de várias áreas (História, História da Arte, Design, Humor, Antropologia) permitindo assim um melhor conhecimento deste artista que há mais de 100 anos foi um dos pioneiros do Modernismo em Portugal mas que só agora a sua obra é apresentada em Lisboa.
As conversas serão acompanhadas de outras atividades de divulgação da sua obra: uma mostra de trabalhos de alunos de Design do Produto do Instituto Politécnico de Viana do Castelo, a disponibilização em linha do jornal A Farça, de que Luís Filipe foi Diretor Artístico, pela Hemeroteca Digital ou a apresentação do catálogo da exposição.
Consulte em baixo o programa detalhado:

13 de Fevereiro, sábado, 17 horas O Modernismo e o Folclore
João Soeiro de Carvalho (Musicólogo – subdiretor da Faculdade Ciências Sociais e Humanas /UNL), Carlos Mendes (Antropólogo), Ermanno Aparo e Liliana Soares (Designers - ESTG /Instituo Politécnico de Viana do Castelo)
Terá igualmente lugar a inauguração da mostra Luís Filipe – pixeladas vianenses, com trabalhos inspirados na obra de Luís Filipe feitos pelos alunos do curso de Design do Produto da ESTG /IPVC

18 de Fevereiro, 5ª feira, 19 horas  Modernismo e Humor Gráfico
 Osvaldo Macedo de Sousa (Historiador do Humor e da Caricatura | Humorgrafe)
e Rui Pimentel (Cartoonista)
Antecede a apresentação da disponibilização em linha na Hemeroteca Digital de Lisboa do jornal A Farça (1909 – 1910) de que Luís Filipe foi Diretor Artístico, por João Carlos Oliveira (Hemeroteca Digital / CML) http://hemerotecadigital.cmlisboa.pt/Periodicos/AFarsa/AFarsa.htm

25 de Fevereiro, 5ª feira, 19 horas Imprensa Humorística e República
António Ventura (Historiador - Faculdade de Letras/UL)
e Ana Vasconcelos (Historiadora da Arte Fundação Gulbenkian)
Antecede a apresentação do livro Luís Filipe e a Farsa da Vida da autoria de João Alpuim Botelho, Mariana Caldas de Almeida e Pedro Bebiano Braga

Luís Filipe (1887 – 1949) foi um dos pioneiros do Modernismo em Portugal. A exposição patente no Museu Bordalo Pinheiro Luís Filipe e A Farsa da Vida acompanha o seu percurso artístico, desde os primeiros anos em Coimbra, com o despertar da sua consciência política e social, mas também com a representação de tipos sociais retirados da vida mundana. Foi neste período que publicou o jornal A Farça (1909-1910), um dos primeiros a publicar desenhos modernistas em Portugal, e que faz a ligação ao título desta exposição; os anos que se seguiram à implantação da República, com uma forte presença nos jornais com desenhos acentuadamente políticos, anticlericais e denunciadores de situações de injustiça social; e por fim os desenhos da sua vida adulta, em Viana do Castelo, com caricaturas de figuras locais e representações da cor e movimento do folclore, sempre com um olhar humorístico.

A exposição apresenta também autocaricaturas e obras que outros artistas do grupo de Coimbra lhe dedicaram, como Cristiano Cruz e Almada Negreiros. 

Crónica Rosário Breve O siluro não tem futuro (sermão aos peixes sem Santo António ao barulho) por Daniel Abrunheiro

1. Tenho para mim & por certo que não é cabal a designação de siluro-europeu para a nova praga que assola o imundiciado Tejo da nossa vida tágico-trágica. Não é que esteja errada. É que está incompleta. Falta-lhe especificidade. Siluro-alemão. Assim é que está bem: siluro com alemão a seguir. É peixe tipo gato que come carne? É alemão. Come os espécimenes mais pequenos? É alemão. Nem às avezinhas beira-fluviais permite sossego? É alemão. Até o seu cocó é tóxico quando em aglomerado cardume? É alemão. Tenho provas de que é alemão. Uma metàforazinha me serve de inegável & indesmentível evidência. Esta aqui: O Tejo é Portugal.
2. Portugal é o Tejo. Tal como o Rio sofre de poluentes (olá, Vila Velha de Ródão!; olá, Mação – sim ou não?; olá, Abrantes!; olá, Constância!); tal como o Rio se abaixa de caudal; tal como o Rio é entravado & bloqueado artificialmente por enrediços exploradores desalmados; tal como tudo isto – assim Portugal sofre de ofensas cumulativas ao seu ecossistema financeiro; assim Portugal se abaixa de cócoras para enfermar de atentados incessantes à sua biodiversidade económica; assim à ocidental praia lusitana acode a maré-negra em formato de orca-de-água-não-doce made in Berlim & desovada em Bruxelas com o beneplácito viático de Estrasburgo & de Wall Street.
3. Os Portugueses fazem de sável, de savelha, de saboga, de barbo – mesmo os cuniculófilos. O eixo Berlim-Bruxelas faz de silurus-glanis, que é o nome latino usado para disfarçar aquilo que vos disse: que o siluro é mas é alemão. Mas, ó pessoal piscícola meu compátrio, nota bem que o siluro só é siluro por enquanto. Para nossa haliêutica desgraça, e caso nos obstinemos em democraticamente seguir pela Esquerda, a voraz avantesma há-de passar ao formato do bem pior & famigerado lúcio-perca. Perca a gente a determinação, que assim desgraçadamente será como a gente se perderá.
4. Há muito que a máscara do espantalho teutónico caiu já. Aquela bocarra grande é mesmo para nos comer, à maneira do pedófilo lobo do capuchinho (precisamente, precisamente) vermelho. Ao arrepio da nossa Constituição & ao atropelo da nossa Soberania, o siluro-alemão quer (mais ainda) atirar dentuça omnívora via “alteração estrutural a nível (ou aníbal…) do rigor orçamental”, que é como se diz em economês “mais roubalheira com fartura, que a gente é que sabe, pode e manda”. O lúcio-alemão quer mesmo irrevogáveis (sem ser à PP) as medidas que nos foram coelhamente mentidas como temporárias. O bicho não descansa enquanto nos não infestar a Função Pública e nos não superhipermegagigataxar o IRS. A furtiva besta de fundão fluvial há-de dejectar quanto puder quando em cardume. Há-de continuamente alinhavar equipas técnicas (olá, Octávio Machado!) infamemente capazes de menosprezar quanto vale, sem ser em dinheiro, um centro de saúde, uma escola, um tribunal, uma ponte, um investigador, um enfermeiro, um operário da Rical, um reformado, uma criança.
5. Dispomos todavia de uma esperança sensata. Até leva, ou traz em si, o nome da nossa Capital. Refiro-me à maneirinha boga-de-boca-arqueada-de-Lisboa. É criatura lusitana, tem bebido uns copos e feito umas piscinas ali pelas Ribeiras de Muge e de Almoster, parecendo que no Rio Trancão também. Ora, é minha firme crença e minha férrea disposição que a boga não tem de ter medo do siluro. O siluro é tosco, é gordo, é pesado, é aleijado, é grotesco, é contranatura. O siluro-alemão rima com aberração. A boguinha nossa, não. É miudinha mas é nossa. É quase irrelevante mas é (d)a gente. A semelhança morfológica dela para com afins espécies ciprinídeas é a nossa própria semelhança para connosco mesmos. A boga deve pôr-se em voga. A única modificação que se lhe/nos pede, é esta aqui: que em vez de mandar(mos) bocas arqueadas, mandemos mas é o vozeirão a direito. A boga não pode esquecer-se de que duas vezes no século XX o siluro-alemão se armou em super-espécie invasora – e que duas foram as vezes em que foi arpoado à maneira na corneta. A boga deve acreditar que às três só é de vez quando o peixe se deixa morrer pela boca. Ou quando não passa de carapau-de-corrida.

Ora, a maneira que temos de interditar o futuro ao siluro é fazer-lhe ver, e de vez, que, para quem somos, bacalhau já não basta.

sábado, 6 de fevereiro de 2016

O fenómeno “Parada da Paródia” como semanário de humor por António Gomes de Almeida


Penso que não há exagero em classificar como fenomenal um semanário de Humor que nasceu na sequência do êxito popular de que gozavam os Parodiantes de Lisboa, na década de sessenta do século XX – mas conquistou, por mérito próprio, a sua independência Humorística.
Todos os que trabalham, ou trabalharam, em órgãos da nossa Imprensa Escrita sabem que a edição de revistas e jornais é condicionada por factores comuns a todos eles, e que podem explicar-se deste modo: 1. – As tiragens são, normalmente, pequenas (por razões culturais, porque o País é pequeno, porque há pouca gente com hábitos de leitura – todos conhecemos estas razões); 2. – Nenhuma publicação sobrevive apenas com as receitas das vendas e das assinaturas; 3. – As receitas da publicidade são essenciais para a sobrevivência... Ora bem, estes factores são ainda mais evidentes quando falamos deImprensa Humorística ou Satírica, para a qual os Anunciantes sempre tiveram grande relutância em encaminhar as suas verbas publicitárias, talvez por acharem que “não parece bem” colocar um anúncio de uma empresa “séria” num jornal de Humor…
Todavia, nenhuma destas condicionantes se verificou, no semanário Parada da Paródia.As tiragens foram excelentes, houve lucros, e houve publicidade a um nível muito razoável.
O jornal surgia como complemento impresso daquele Humor que tornara os Parodiantes campeões das audiências radiofónicas, com programas tão populares como o Teatro Trágico, o Vira o Disco e oGraça com Todos, este último acompanhando estrategicamente a hora do almoço dos portugueses, (ainda sem a concorrência da Televisão), e com personagens tão marcantes como Patilhas & VentoínhaJack-Taxas & Cara-Linda, ou o Compadre Alentejano. Parece fácil explicar que o êxito do jornal se basearia, por arrastamento, no êxito da Rádio… Mas essa, sendo a explicação inicial, deixou de o ser à medida que as semanas foram correndo e, após a espectacular tiragem de 54 mil exemplares dos primeiros números, coisa nunca vista até então, as edições estabilizaram à volta de uns excelentes 20 mil exemplares, e só viriam a diminuir um pouco quando parte das atenções do público se desviaram, em 1961, para a Imprensa Diária, por causa das notícias sobre a Guerra Colonial.
Qual é, então, a explicação complementar para o êxito da Parada da Paródia? Sem dúvida, a qualidade dos textos e das ilustrações que apareciam nas suas páginas. E a imaginação, renovada semana após semana, com a edição de números dedicados a temas originais tão inesperados como as Moscas, as Casas de Penhores, as Parteiras, as Bruxas, o Fado, os Guarda-Nocturnos, osQueijos, os Carteiros, as Varinas, a Água – e até o Vinho (este último numa edição impressa a roxo, e contendo um vale que dava direito a ir tomar um copo num estabelecimento do produtor que patrocinava o tema)...
Algumas secções fixas reproduziam temas transpostos da Rádio, como o Rádio-Crime e as paródias aos folhetins radiofónicos; mas outras, para além dessa origem, eram popularíssimas, como ABronca da Semana, o Guichet de Reclamações, o Ficheiro dos Caricaturistas e o Expediente do Director. E foi lançado, entre outras iniciativas, um concurso para eleição da Flausina Modelo, que teve uma adesão invulgar.   
A diferença estava, sem dúvida, no especialíssimo lote de colaboradores – os que escreviam e os que desenhavam – e na qualidade do Humor apresentado.
Mas, antes de falarmos desses aspectos, comecemos pelos pormenores técnicos:
Parada da Paródia foi publicada semanalmente, às quintas-feiras, durante dois anos exactos – do número 1, de 10 de Novembro de 1960, ao número 104, de 1 de Novembro de 1962.
Tinha o formato 31x23 cm, e era impressa em rotativa, em sistema tipográfico, a preto e uma cor, em papel normal de jornal.
Cada exemplar custava vinte e cinco tostões (2 escudos e 50 centavos, o equivalente, em Euros, a menos de 1 cêntimo e meio).  
O primeiro número tinha 16 páginas, 8 das quais a duas cores, mas, logo no número 2, o êxito das vendas obrigou a aumentar o número de páginas para 24. Mais tarde, a partir do número 27 e até ao número 70, passaria a publicar 28 páginas, sendo as 4 suplementares impressas em offset. Do número 71 até final, voltaria às 24 páginas, eliminando as 4 suplementares em offset.
Era impresso na Casa Portuguesa, uma tipografia da Rua das Gáveas, no Bairro Alto, onde também se imprimia, entre outros, o Diário Ilustrado.
QUEM FAZIA A PARADA DA PARÓDIA
É importante recordar a listagem de todos, ou quase todos, os que passaram pela Parada, como apareceram na Ficha Técnica respectiva.
Director - António Gomes de Almeida
Editor - Ruy Andrade
Chefe da Redacção - Manuel Puga
Chefe de Publicidade - José Andrade
Redactores – Matias Redondo (Carlos Pinhão), que escrevia a secção desportiva Meia Bola e Força!Macacão (António Rolo Duarte), que fazia a secção de Espectáculos Ver, Ouvir e Gozar;Flausina (Maria João Duarte) que respondia ao Correio da Flausina; Raúl da Costa, ex-autor de teatro de revista, com colaboração variada; Antero do Quintal e Camilo com E (Antero Nunes e Benjamim Veludo) que escreviam À moda do PortoPepe (Álvaro Magalhães dos Santos), que escrevia As Aventuras do Arnestinho e a Antologia do Pensamento MentalZé que Ri, autor dasBroncas Rimadas – e, de vez em quando, mais alguns.
Para além destes colaboradores, que escreviam as secções fixas, o corpo do jornal era preenchido com textos do Director, do Chefe da Redacção e alguns do Editor.
Quanto aos Desenhadores, nunca se reuniu, num mesmo jornal, um lote tão grande e tão talentoso como este!
O desenhador principal (autor de todas as capas, de muitos cabeçalhos, ilustrações, cartoons e muito mais) era o João Martins, que viera de O Mundo Ri, e que iria, mais tarde, dedicar-se a filmes de desenhos animados, e também a trabalhar como grande ilustrador de A Bola e de o diário, para onde foi levado pelo Carlos Pinhão.
Além deste divertido personagem, a lista dos desenhadores incluía o Túlio Coelho (que transformava em Banda Desenhada as radionovelas do Teatro Trágico); o Manel (Manuel Vieira), que também trabalhava para a RTP; o alentejano Mário Elias, cujo nome seria mais tarde atribuído a uma Casa das Artes em Mértola; o tímido portuense Miranda; o excelente ilustrador Vítor Ribeiro; o José Antunes (que chefiaria depois o sector gráfico da Verbo e o do Círculo de Leitores); o talentoso Zé Manel (filho do artista Meco, e um dos mais talentosos ilustradores deste País, que publicaria aqui os seus primeiros bonecos); o Reinaldo; o animado e meio louco Gustavo Fontoura (que, com o Manuel Puga, publicaria dois volumes de "fotogozos" com o título Puflas); o Moreira Rijo, que trabalhava na RTP; o Vítor Milheirão, chefe do restauro na Gulbenkian, com o seu amigo inseparável, o Ricardo Reis; o João Benamor, que era militar e fazia, nas noites em que estava de serviço no quartel, uns desenhos cheios de minúcia, muito bem acabados; o Mário Jorge, filho e herdeiro do estilo do conhecido Mário Neves, autor de excelentes filmes publicitários para a TV, como os da Laranjina; o Augusto Cid, que já tinha então uma produção e um talento enormes; o Rui Torres, este pouco assíduo; o Yoke, que tinha um estilo original, mas também publicou pouco; o Joes (Jorge Esteves, que mais tarde seria professor na António Arroio, depois de ter sido colaborador na Regisconta); o Ton (António Gomes Ferreira), de Coimbra; o Fausto Boavida; e ainda um Arruda, um Machado, um Toni e um Guerra, que tiveram escassa colaboração; o Helder Martins, sobrinho do João Martins, que mais tarde publicaria o seu frustrado jornal A Chucha; e ainda, na fase inicial, dois outros grandes desenhadores, dos quais se tinham publicado antes os primeiros bonecos, na revistaPicapau: o Vasco (que então ainda assinava Agostinho de Castro), e o Adolfo Feldlaufer, um dos artistas mais originais que ali apareceram, o que veio a comprovar-se mais tarde, no seu trajecto internacional.
Uma lista impressionante!
Faziam ainda parte da equipa os Fotógrafos: o Luís Henriques e os dois profissionais da Publifoto.
Parada da Paródia foi um êxito, logo a partir do primeiro número, que foi um verdadeito estouro! Teve de ser reforçada a edição, à pressa, atingindo-se os 54 mil exemplares, o que era verdadeiramente extraordinário, para a época! Por isso, a partir do número 2, "brindaram-se" os leitores com mais páginas e mais Humor.
As coisas corriam muito bem, em termos de vendas – embora, em 1961, com o início da guerra em Angola, se começasse a notar uma certa quebra. As pessoas andavam inquietas com o que se passava em África, compravam mais jornais diários, por causa da informação, aliás escassa, e estavam menos viradas para publicações deste género. No entanto, tudo indicava que o jornal, do ponto de vista comercial, continuava a ser um excelente negócio.
AS NOITES DE QUINTA-FEIRA NO DÉCIMO-TERCEIRO ANDAR
As reuniões de redacção da Parada da Paródia eram à noite, às quintas-feiras (o dia da semana em que o jornal saía para a rua), no 13º andar do prédio da Avenida dos Estados Unidos da América nº 102, numa grande sala ao lado do estúdio de gravação e dos escritórios das duas firmas associadas: "Parodiantes de Lisboa, Lda.", que geria toda a actividade relacionada com a Rádio e tinha dois sócios, os irmãos Andrade – e "Tela-Parodiantes", que tratava de todos os outros tipos de publicidade.
Eram reuniões animadíssimas, cujo barulho animava os treze pisos do enorme edifício, em cuja base estava instalado um estabelecimento que era uma espécie de "Templo do Cinema Moderno Português" – o Café Vává, centro de convívio de cineastas, jornalistas, músicos e outros artistas.
A ele desciam todos, de corrida, um pouco antes das duas da manhã (que era a hora do encerramento do café), para a última bica. Mas, quase sempre, tornavam a subir, para continuar o trabalho, a conversa e as piadas. Era, sem dúvida, uma redacção muito alegre.
Aparecia sempre muita gente, porque era nesse dia que se combinavam temas para os números seguintes e se distribuíam tarefas. Claro que, na primeira quinta-feira de cada mês, ainda aparecia mais gente – porque era o dia de pagamento das colaborações... Cada peça (texto ou boneco) valia então entre 25 e 50 escudos, o que não era nada mau, em relação ao nível praticado pelos jornais da época. E havia uma folha de colaboradores enorme!
Os ardinas (que ainda existiam, nesse tempo) eram incentivados a gritar, nas ruas, o nome daParada da Paródia. E havia um prémio de cem escudos para aquele que o apregoasse mais alto!
COLABORADORES MUITO ESPECIAIS
Já se viu que a Parada da Paródia tinha muitos colaboradores. Uns tinham mais piada que outros, como é evidente – mas, entre eles, houve quem se tornasse notado por razões que pouco tinham a ver, directamente, com o Humor.
Ao acaso, aqui vão dois episódios: um, de um colaborador da parte escrita; outro, de um desenhista...
Certo dia, recebeu-se na redacção uma carta assinada com o pseudónimo "Zé que Ri", sem mais indicação alguma; nem nome, nem morada – nada. Eram uns versos em forma de gazetilha, muito bem feitos e com muita graça. Ficaram a repousar numa gaveta, à espera de identificação do autor.
Daí a dias, nova carta e novos versos, ainda melhores e ainda com mais graça. E, uma semana depois, outra. Resolveu-se começar a publicar aquilo. Arranjou-se uma secção com o título "Broncas Rimadas" e, semana após semana, foram-se publicando as gazetilhas – que continuavam a vir pelo correio, regularmente. E nós sem sabermos nada do autor! "Mas lá que o tipo tem graça, isso tem! Vê-se que é um rapaz de espírito jovem e arejado!" – era o que todos comentávamos, na redacção.
Até que, um dia, batem à porta e aparece, finalmente, o misterioso "Zé que Ri". Vinha, timidamente, saber se tinha alguma coisa para receber, das suas colaborações. Claro que tinha, e logo lhe foi pago. Só que... para nosso espanto, o "tipo com piada", o "jovem arejado" não era um "tipo" nem era nada jovem; era, sim, uma senhora já entradota, pequenina, feíssima, ainda que muito simpática!...
Quanto ao outro episódio, tem a ver com um dos numerosos desenhadores que por lá apareciam, nas reuniões de redacção. Só que este (cujo nome não se revela, já vão perceber porquê), estava longe de ser das companhias mais apreciadas. É que o rapaz cheirava mal que era uma coisa por de mais! Assim que franqueava a porta da redacção, espalhava-se por toda a vasta sala um fedor impossível de aguentar. Logo alguém corria a abrir as janelas. Qual quê! A intensidade do mau-cheiro superava todas as correntes de ar provocadas para afastá-lo! O pior era no inverno, quando o frio, o vento e a altitude (recordo que estávamos num 13º andar!) nos punham em perigo de substituirmos um valente mau-cheiro por uma valente constipação.
Ainda por cima, o moço não tinha a mínima noção do incómodo que causava. Adivinhava-se que não tomava banho há, pelo menos, um ano – se é que alguma vez experimentara tão insólita operação. A gente lançava indirectas, contava histórias, falava do Luís XV (que constava nunca se ter banhado – mas esse, ao menos, encharcava-se em perfumes, para disfarçar). O nosso desenhista mal-cheiroso nem pestanejava.
Um dia, sabendo que ele fazia anos, resolvemos oferecer-lhe um enorme sabonete, artisticamente embrulhado, com uma dedicatória apropriada. Ele abriu o pacote, desconfiado, e saíu-se com uma frase que nos fez perder toda a esperança de que a situação (e o cheiro) algum dia desaparecessem: "Mas... isto serve para quê?"...
ERA UMA CASA PORTUGUESA...
Enquanto durou a Parada da Paródia, as noites de segunda-feira do Director eram passadas no Bairro Alto. Mas... nada de más interpretações! Embora o local, nessa época, fosse conhecido pela concentração de "casas de meninas" que o infestavam, havia, pelo menos, duas outras características que lhe davam especial interesse: era, igualmente, o bairro onde se encontravam muitas das casas de fados de Lisboa; e, também, a maioria das redacções de jornais, bem como as tipografias.
Uma destas era a "Casa Portuguesa", onde se imprimia a Parada da Paródia. Por isso é que o Director "entrava de serviço" ao fim da tarde de segunda-feira, quando começavam a ficar prontas as provas de texto que era preciso rever, e lá ficava até o jornal estar pronto a entrar na máquina, o que tanto podia verificar-se à meia-noite como às duas da manhã, ou às quatro, como aconteceu muitas vezes. Este "horário de trabalho flexível" dependia da Censura. As provas eram enviadas à medida que estavam prontas e, durante aquele período de tempo, era um corrupio, da tipografia para a Censura e da Censura para a tipografia, até estar tudo devidamente autorizado, com o carimbo oficial aplicado a todas as provas, de texto e de bonecos.
Quando as coisas corriam bem, aquilo despachava-se depressa; mas, quando os senhores Coronéis censores embirravam com qualquer texto, ou qualquer imagem, era mais complicado. Então, era necessário tornar a distribuir o material gráfico, repaginando o jornal e tapando os buracos que tinham surgido. Havia sempre um stock de gravuras soltas, que serviam para isso mesmo: para tapar os buracos que a Censura abria, inventando-se um texto mais ou menos apropriado, que se ajustasse a cada boneco, e mandando recompor aquilo tudo. Era um desafio à capacidade de imaginação e de "desenrascanço" que, nesses tempos, era um factor absolutamente indispensável a quem andava nestas vidas de jornais e revistas.
Isto significava várias horas seguidas em contacto com uma gente muito especial, que nos habituámos a admirar e a respeitar, e com quem sempre gostámos de conviver: os Gráficos. Enquanto se esperava que viessem as provas da Censura, jantávamos juntos numa tasca à esquina da Travessa da Queimada. Depois, enquanto se compunham as últimas legendas, ali se esperava, indicando os tipos a usar, lendo os textos às avessas, nas páginas já meio arrumadas, conversando com os compositores, com os impressores, com o chefe da oficina...
Deste, guarda-se uma lembrança pitoresca. Era o Miranda, um gordo bem-disposto, que usava uma linguagem profissional curiosamente repetitiva, porque, dizia ele: "esta malta, se a gente não explica tudo bem explicadinho, faz disparate”. E então, para indicar a um jovem operador de composição como queria um título, ele dizia assim: "Olha que isso é tudo em versais, ou seja, em caixa alta, portanto, tudo em letra grande, ou seja, em maiúsculas, tás a ouvir? E é um título centrado, mas centrado mesmo ao meio, metade para cada lado, percebeste?"
Nunca se chegou a saber até que ponto isto era propositado, quer dizer, se ele falava desta forma por piada, e se esta linguagem era mesmo assim, deliberadamente tosca. Mas parece que sim, porque havia outros exemplos do seu Humor. Quando, um dia, foi preciso refilar por causa de uma "gralha" que saíra num texto, o Miranda retrucou, calmamente: "Ora, não vale a pena dar tanta importância a isso! Um jornal sem "gralhas" é como a Sofia Loren sem mamas: não tem piada nenhuma!"
OS 5 TOSTÕES DO CONTABILISTA VARELA
O jornal acabou prematuramente. E acabou, não porque não continuasse a ser um êxito de vendas, mas por má gestão dos recursos financeiros da organização. E também por evidente falta de competência do contabilista de então (um pitoresco Sr. Varela, sempre muito preocupado com verbas de tostões, mas sem capacidade para gerir verbas de milhões). E isso provocava alguns problemas de tesouraria. Por outras palavras: não é que faltasse dinheiro, mas os recebimentos e pagamentos eram mal escalonados no tempo.
Ao contrário do que se passa no marketing moderno, as contas, nesse tempo e naquelas circunstâncias, não serviam para se fazer, dia a dia, a gestão do negócio: serviam, isso sim, para – com um atraso de meses ou, mesmo, de anos! – se apresentarem, finalmente, uns balancetes muito bem elaborados, é certo, mas que apenas serviam para se ficar a conhecer o aspecto "histórico" do passado.
Era assim a contabilidade de então. E era assim o contabilista, um senhor muito simpático, uma jóia de pessoa, mas aquilo a que se pode chamar, com propriedade, um atraso de vida… Todas as semanas lhe era feita a pergunta: "Então, senhor Varela, as contas do jornal? Quantos exemplares se estão a vender?" – e, todas as semanas, ele respondia, invariavelmente: "Estou a fazer o balancete, mas há uma diferençazinha..." Era preciso insistir: "Mas, não pode dar uma ideia? Não interessam números exactos, é só para saber, pouco mais ou menos, se estamos a vender vinte mil, quinze mil… ou só quinhentos exemplares! Uma coisa aproximada!" E ele: "Tenho que ver melhor. Há uma diferençazinha de cinco tostões..."
Ao fim de vários meses, a conversa já era aos gritos: "Mas isto, afinal, está a vender ou não está?!" E o senhor Varela: "Há uma diferençazinha. Ando à procura de cinco tostões..." Todos nos oferecíamos para dar, generosamente, dos nossos bolsos, os cinco tostões, para arrumar a questão. Nem pensar! O senhor Varela sorria e repetia: "Só depois de acertar as contas. Há uma diferençazinha..."
Acreditem ou não, esta cena durou meses. Entretanto, os manos Ruy e José Andrade, que se tinham habituado a viver muito à vontade, pois os programas de rádio, nessa altura, davam muito dinheiro, começaram a andar inquietos. É que havia, em cada mês, duas grandes facturas a pagar: a do tempo de antena no RCP (que era sagrada e tinha de ser paga até ao último dia de cada mês) e a da tipografia (que, por uma falta de senso incompreensível, tinham combinado pagar até ao dia 8 seguinte). Claro que, depois do esforço de cobranças de cada fim de mês, era muito difícil, nos escassos 8 dias seguintes, cobrar o suficiente para pagar a gorda factura da tipografia. Por isso, a ideia tonta que se instalou foi esta: "Se é tão difícil arranjar o dinheiro para pagar as despesas do jornal... é porque o jornal não está a dar dinheiro!" E, como o sr. Varela não dava números, por causa dos 5 tostões que faltavam, esta suspeita foi-se transformando em certeza. Um dia, os Andrades convocaram toda a gente e disseram que a Parada da Paródia tinha que acabar.
Argumentar, como, se não havia dados, números, estatísticas? Assim acabou a "Parada da Paródia", ingloriamente... em plena glória editorial! Isto porque, uns seis meses depois, surge o senhor Varela, com um sorriso radiante, uns papéis cheios de algarismos na mão, cantando vitória: "Pronto, aqui estão as contas! Sempre achei a tal diferença dos cinco tostões. E, olhem, sabem uma coisa muito engraçada?... Mesmo nas semanas mais fracas, quando foi aquela coisa da guerra de Angola, o jornal deu sempre lucro! Sempre!"
O senhor Varela já morreu há anos. De morte natural, coitado. Mas, até hoje, ninguém conseguiu explicar o que impediu, naquele dia e naquela hora, o seu assassínio, lançando-o da janela do nosso 13º andar!...
…E aqui está como uma publicação de Humor, que tinha a missão de deitar Humor cá para fora – também viveu, por dentro, situações humorísticas (ainda que, às vezes, de um Humor um tanto ou quanto negro)…

(O autor foi director do jornal “Parada da Paródia”)