João Estrompa faleceu na 6ª feira, dia 18
Aqui ficam a Biografia do autor, do Dicionário dos Autores de Banda
Desenhada e Cartoon em Portugal, de Leonardo De Sá e António Dias de Deus e uma
peça de Geraldes Lino publicada no Tertúlia BDzine #64, de 4 de Março
de 2003. Deixo também o Tertúlia BDzine #63 com a história Batman,
de Estrompa, editada nesse mesmo Encontro. Estrompa viria a ser Homenageado no
264º Encontro da Tertúlia BD de Lisboa em 7 de Novembro de 2006.
José João Amaral Estrompa nasceu a 8 de Fevereiro de 1942, em Lisboa. Cursou a
Escola de Artes Decorativas António Arroio e começou a sua carreira como
desenhador litógrafo. Foi um dos colaboradores gráficos das versões portuguesas
de Tintin e Spirou, assim como dos álbuns da Colecção Banda
Desenhada, da Bertrand. No Diário de Notícias Semanalteve a secção
"Humor de Estrompa" (1982-83), colaborando em Pão Com Manteiga, Tintin,O
Mosquito (5ª série), Jornal de Almada, Selecções BD, Notícias
do Entroncamento. Publicou várias histórias e ilustrações em fanzines como Protótipo, Almada
B.D. Fanzine,Banda, Comic Cala-te, Boom!!!, Classe Média, BD
& Roll, Seasons of Glass, Vertigens,Cafénopark, e Shock
Fanzine, sendo editor destes dois últimos. Um dos seus personagens carismáticos
é o detective de paródia, "Tornado", numa Nova Iorque que mais parece
o Bairro Alto ou o Cais do Sodré que o Bronx... Essa figura de gabardina voltou
às investigações sumárias na 2ª série de Selecções BD, em 1999. Participou
no álbum colectivo Entroncamento de BD's, em 1996, e em diversas exposições,
tendo recebido prémios nas categorias BD e cartoon.
In Dicionário dos Autores de Banda Desenhada e Cartoon em Portugal, de
Leonardo De Sá e António Dias de Deus, NonArte – Cadernos do Centro Nacional de
Banda Desenhada e Imagem, Edições Época de Ouro, Costa de Caparica 1999.
Acrescentemos também que Estrompa participou na Mutate & Survive (Colecção
Chili Com Carne #2; 2001), na Lx Comics nº 13 (Tornado – Só me Saem
Dukes!), em Outubro de 2002 e Vasco Granja: Uma Vida... Mil Imagens, em
2003. Colaborou ainda no BDjornal #5, de Setembro de 2005, com as
sete pranchas de Uma História Triste

BIOGRAFIA DE ESTROMPA por
Geraldes Lino

José João Amaral Estrompa nasceu em Lisboa, em mil novecentos e quarenta e dois
(mas parece ter a idade do Tornado, desde que rapou a barba). Frequentou a
Escola António Arroio, sem ter concluído o respectivo curso. A sua área
profissional foi sempre a Publicidade e Artes Gráficas. Nas revistas Tintin, Pão
com Manteiga, DN Semanal, Mosquito(5ª série) e Selecções BD (1ª
série) publicou cartoons e bedês cómicas, de uma página, com animais de
características antropomórficas – Pink (um gato) e Smaile (um
cão que tem um gato amigo chamado Smool). Mas a sua maior produção é mesmo
nos fanzines, com destaque óbvio para os numerosos episódios da sua série de
referência, o Tornado 1989 – este já com duas merecidas promoções: ao
fazer dez anos de existência (1999) teve publicação na revista Selecções
BD (2ª série), surgindo posteriormente em álbum editado pela Bedeteca de
Lisboa. Foi de igual modo nos fanzines que, embora de forma esporádica,
Estrompa fez viver a comportamentalmente subversiva Família Darling.
Sempre com a fusca calibre 69 pronta a entrar em acção, uma beata permanente ao
canto da boca, chapéu, gravata amarela sobre camisa de seda azul (apesar de a
série sempre ter sido publicada a preto e branco, sabemos que são essas as suas
cores, graças às descrições do narrador), mais as suas inseparáveis luvas de
genuína pele de porco – tão inseparáveis que nem nas cenas de sexo as tira ! –,
Tornado 1989 é um dos raros heróis fixos da banda desenhada portuguesa. Com a
particularidade de ter nascido e vivido até há pouco unicamente nas páginas dos
fanzines – Banda, Comic Cala-te, BD & Roll, Shock,Almada
BD Fanzine, CaféNoPark, Seasons of Glass, Boom e Tertúlia
BDzine, por onde já se espalham duas dezenas de episódios. O seu aparecimento
em Julho de 1999, no nº 2 (2ª série) da revista Selecções BD correspondeu
à oportunidade de saltar das publicações amadoras para uma profissional. Três
anos depois, Tornado voltou a ter a oportunidade de mostrar-se em
suporte de prestígio, a colecção LX Comics editada pela Bedêteca de
Lisboa.
Estrompa, o autor (argumento e desenho) do Tornado 1989, considera-o como
que “um cavaleiro andante do asfalto”. Ternuras cúmplices de criador... Do que
não há dúvidas é que, seja no nome, seja no aspecto físico, ou até no
vestuário, ele tem semelhanças comTorpedo 1936, personagem de referência na
banda desenhada espanhola, criada pelo traço de Jordi Bernet sob o argumento de
Enrique Sanchez Abulí. Quando Estrompa viu pela primeira vez o Torpedo, em
1985, nos álbuns da entretanto extinta Editorial Futura, apercebeu-se que ele
lhe fazia voltar à memória as imagens de alguns actores que o tinham
impressionado na infância, uns tais Humphrey Bogart, James Cagney, Edward G.
Robinson... Daí a criação de Tornado 1989, anti-herói que o autor admite
ter desenhado um tanto à maneira de pastiche do Torpedo, embora sejam de
sua autoria, enquanto argumentista, as diferentes e muito especiais
características de malandro profissional evidentes no Tornado – o
qual tem sido um pouco de várias coisas: polícia, mas também ladrão, detective,
dono de um bar em Casablanca... – versatilidade que lhe confere uma
personalidade desconcertante e muito própria.
Tornado foi criado graficamente em 1989, pormenor em destaque no nome de
guerra com que se apresenta. Ao longo da sua existência tem-se constatado que
ele possui tendências, humorísticas e críticas, diferentes da do respectivo
modelo. Os constantes apartes, brejeiros ou sardónicos, que intercalam os
diálogos e pensamentos da personagem, bem como os comentários mordazes do
narrador, criam à série, por sua vez, uma textura interventiva que rareia nas
suas congéneres. Aliás, Estrompa, o seu manipulador literário e gráfico, envolve-o
nas mais insólitas peripécias, desde obrigá-lo a fazer-se passar por travesti
(a “menina” Tornada, no episódio Torpedo contra Tornado), a deixá-lo
apanhar uma doença venérea (no episódio Uma História de Cowboys), até não
o poupar a uma cena imprópria para um protótipo de machão latino: a de ser
sodomizado por dois ou três “gorilas”, às ordens dum mafioso com voz cavernosa
e cara de Marlon Brando (episódio O Padrinho). Estas e outras situações
insólitas, conferem-lhe uma dimensão ficcional de grande originalidade no
universo da banda desenhada portuguesa, tornando-o num anti-herói exemplar.

Para quem entrar pela primeira vez em contacto com Tornado, há que
esclarecer que o seu nome real é Bogarte – para os amigos já foi Garte,
passou depois a ser Bogey, mas, para as “girls”, foi sempre e apenas o Boga. Tornado é
simples alcunha, criada por ele expressamente para a bófia, mas serve
igualmente para os tansos e “nalfabétus”, conforme diz no seu português rasca
em ocasionais confidências. Quanto à idade, tem a que aparenta : quarenta
sombrias “prima-beras” – assim escreve o seu “biógrafo” Estrompa – completadas
num qualquer mês do signo de Carneiro; no que se refere ao local de nascimento,
os elementos fornecidos na sua apresentação (Banda nº 10, Agosto de 1990)
não são minimamente credíveis, visto que mencionam em simultâneo, dois locais
geograficamente bem distantes: Nova Iorque e Casal Ventoso! Será que, afinal, é
português de origem, embora naturalizado americano? Com efeito, ele conhece bem
Lisboa, tão bem que até gosta, como diz a certa altura, “de ir beber um uísque
com gêlo a uma espelunca ali p’rós lados do Parkmayer” (citação textual). Mesmo
a sua divulgada filiação – pai polaco, mãe italiana, emigrantes – poderá ter
sido forjada, para despistar a bófia. Onde estará a verdade ? Alguma vez se
virá a saber ?
Estrompa & Tornado formam uma dupla muito sabidona, sempre com trunfos
escondidos na manga...
in "Tertúlia BDzine, Nº 64, 4 Marco 2003 – Distribuição gratuita na
Tertúlia BD de Lisboa"