1 “Tenta
viver como se fosse manhã.”
Isto é Nietzsche lido por Bloom (H.).
Parece-me boa injunção. Não é fácil: a noite figurada parece invencível as mais
vezes. Não é fácil – mas é possível. E se é possível, está ao alcance.
Em caleidoscópio, as imagens do mundo
concorrem-nos sem cessação. A atenção dispersa-se ao sabor (quantas vezes
amargo) dos estímulos. A honestidade existe, mas não campeia. O banditismo
parece integrar a essência humana. Os valores tidos por essenciais (direito à
vida, ao trabalho, à saúde, à honra, à paz) podem ser e são escamoteados a
pretexto de fantasmas obstinados: a superstição, a ganância, a ignorância, o
preconceito, a dominação.
A veracidade evidente destas constantes é avessa
à tal manhã existencial. Mas é
possível combatê-la – antes que se faça tarde.
2 Na exígua paróquia do Universo chamada
Portugal, os últimos tempos voltaram a ser fustigados pela euforia bêbeda da bola. Pelas redes sociais, umas (poucas)
almas ainda verberaram tanta barulheira gráfica. Tipo assim: “Ah Portugueses dum caraças, se o desemprego,
a saúde, a justiça e a austeridade forçada vos fizessem cerrar sempre fileiras
combativas assim, seríamos para aí duas Suíças”. Mais ou menos isto. O
espírito era este, se não o texto. Mas – quê? Rui Jorge Vitória Jesus, Jonas
Fisgas Slimani Pistolas etc. etc. etc. etc.
3 Nos entrementes, há quem queira (e o queira
muito) intoxicar a opinião pública com a antinomia Escola Pública – Colégios
Particulares/Cooperativos. É natural
que sim: estão em jogo os milhões de todos a saque de uns poucos. A necessidade
pretérita dos ora famigerados contratos
de associação tem sido em muitos casos, mercê do crescimento da oferta
pública de rede escolar, debelada. Assim sendo, proponho três equações simples:
Dinheiro Público – Escola Pública; Dinheiro Privado – Escola Privada; Caixa de
Esmolas – Ensino Religioso. Pim, pam, pum. Posto de outra
maneira: onde o contrato de associação se justifique (e há
casos em que sim, note-se bem), cumpra-se; onde não, rasgue-se. E siga(mos) para bingo.
4 Se duas causas há que não apenas me não merecem simpatia como bem antes
pelo contrário, elas são:
- a dos taxistas de Lisboa;
- a dos suinicultores nacionais.
Há tempos, na TV, um taxista queixava-se de que “por causa da Uber, só fazemos serviços para a chungaria”,
acrescentando que “a polícia anda sempre
em cima de nós e se levamos um euro a mais é o diabo”. Isto nem carece de
comentário.
Quanto à suinicultura nacional, relembro tão-só que a ganância impura e
simples, anos/décadas a fio, tem levado os produtores íncolas a desprezar as
mais básicas condições ecológico-ambientais suas envolventes. ETAR? Os
municípios que as paguem. Sei, infelizmente sei, muito bem do que falo:
habitante há anos de uma região enxameada de pecuárias afins, não desconheço os
recorrentes (e não punidos) atentados contra, por exemplo, os aquíferos e os
flúvios. Como se também os suinicultores estendessem à chungaria consumidora a pouca higiene do seu/deles porquinho.
5 Onde isto já vai: comecei citando Nietzsche e já
ronco… Não é grave, porém: a realidade ficará exactamente no mesmo sítio,
pesada, inamovível, indiferente a estas minhas filosofices impotentes. Salva-me
todavia o facto vero & mesmo de ser manhã. Objectivamente manhã.
Horariamente manhã. Tenho o dia todo (tê-lo-ei?) por minha conta. Na cama que
dele fizer, a noite passarei.
E nela sonharei, naturalmente que sim, com o meu tetra na próxima época.
Assim seja.
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