Não.
Mas sim.
José Niza.
Luís Eugénio Ferreira.
Eurico Heitor Consciência,
agora.
Mas sim é que não: não
negarei ao doutor Consciência um obituário ao mesmo tempo triste & feliz.
Triste – pelo lado do
sacolejão brusco, da violência estapafúrdia, do escândalo insensato que todo o
falecimento de alguém tão merecedor de honra, estima, consideração & elogio
nunca deixa de causar. Mas feliz também, senhor.
Feliz – pelo lado de
absoluta bonomia que a sua desempoeirada figura, a sua figura alta, egrégia sem
favor, ínclita até, esparrinhou por todos (nós) quantos, ou conhecendo-o em
pessoa, ou dele beneficiando a profissão, ou a ele-cronista lendo em duas
colunas de página-cinco, tiveram a muito (tanta!) boa-sorte de contemporanizar.
Respirámos no mesmo
metro-quadrado uma vez única. Foi por uma gala do nosso comum O Ribatejo. Saudei-o como quem sobe. Ele
recumprimentou-me como se não descesse. Trocámos mimos. Não trocámos números
telefónicos. Isso passou – como tudo passa.
Posso finalmente
escrevedizê-lo em voz-alta, agora que ele me não pode ouvi(le)r: foi sempre
pela coluna de Eurico, O Não-Presbítero, que comecei a leitura do meu/Vosso
Jornal. Mais: fi-lo sempre porque as palavras dele nunca me faziam rir – sorrir
sim, sempre, ah isso sim! Ainda esta semana já para sempre pretérita: a
mordedura irónica do seu incisivo de propósito mal escondido, sabes tu, Leitor?
Aquele sarcasmo nunca humilhante, aquele escárnio nunca gozão, aquele maldizer tão bem dito sempre: e aquela
elegância completamente cavalheiresca, de homem antigo que não sabe ser velho,
ai!, aquela compostura toda democrática que ele português, num Português
forrado de quanto Latim, jurídico ou não, fosse preciso ou não fosse, lembra-te
tu, pá, Leitor dele merecido que meu quero merecer – e tudo sempre, mas sempre,
para Todos, todos quanto fossem, quantos viessem todos.
Meti-me uma vez com ele.
Fi-lo sorrir. Eu sabia que sim, que ele sorriria. Sorriu. Que um advogado com Consciência era abrantino fenómeno só
aos fenómenos do Entroncamento cotejável. Ele encaixou sem esgar nem esforço a
minha boutade, que simpatia
sinalética era. Respondeu-me na crónica seguinte com Abrunhos etc. e tal. Foi das maiores honras da minha vida. Eu era
lido. Por ele. Ele respondia ao que eu fingira perguntar.
O doutor Eurico Heitor
Consciência viveu acordado a vida toda, 79 anos dela. Espero hoje e aqui,
tão-só, que a morte no-lo tenha roubado dormindo.
Dormindo e sorrindo, que é o
que precisamente estou a fazer para não desatar a chorar, José Niza. Perdão, para
não desatar a chorar, Luís Eugénio. O senhor sabe, doutor Eurico. Não finja que
não sabe (fazer) sorrir.
Até para a semana.
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